quinta-feira, julho 19, 2007

Comunicação apresentada na E.S. Bragança



A educabilidade como princípio de inclusão social

Resumo

A minha apresentação será focada, numa forma sintetizada, em diversos conceitos nomeadamente, educação social. Cidadania, desenvolvimento humano, exclusão social e a educabilidade como princípio de inclusão social, palco de intervenção da Associação CAIS. O intuito desta mensagem será unicamente a de promover a importância da educação social enquanto prática social e humana nas políticas sociais ligadas ao combate da exclusão.

Começava então por citar uma frase de António Cardoso Ferreira que não poderia deixar de citar para reflexão colectiva.

«Exclusão social, desenvolvimento, educação e cidadania escrevem-se de maneira diferente consoante a vida das pessoas e comunidades que têm por dentro.»

António Cardoso Ferreira

Médico de Saúde Pública
Presidente da Direcção do Grupo Aprender em Festa – Gouveia

Seguindo este pensamento e de acordo com Artigo nº 26 da Declaração Universal dos Direitos Humanos,

(…) Toda a pessoa tem direito à educação e a educação deverá visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos do homem e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos (…) Nações Unidas 1948.

A educação deve visar todo um conjunto de actividades, emanadas das diferentes estruturas sociais, de forma a desenvolver o capital social, humano, cultural e financeiro, necessário e indispensável para que as comunidades e as suas pessoas atinjam níveis mínimos de coesão e desenvolvimento.

É necessário promover novas formas de encontro, apostando numa politica de diversidade e igualdade, respeito pelo próximo e pela sua identidade do outro, enquanto pessoa, apostando na educabilidade e usando-a como ferramenta de minimização de factores de exclusão e como principio da inclusão para todos. As opções de ser e estar, enquanto tal, devem ser valorizadas e reconhecidas numa nova política social, pois isso facilitará muito a interacção e inserção de grupos minoritários em sociedades dominantes, diminuindo assim processos de ostracismo, isolamento ou mesmo de exclusão e auto – exclusão.

As políticas sociais, educacionais, encontram-se em crise, por essa razão é necessário criar respostas ajustadas aos cidadãos, que vivem em situações de extrema exclusão e que dela pretendam sair.

Educar para uma intersecção relacional e pedagógica significa intervir, intervir com uma finalidade, um objectivo concreto e bem delineado, com intenção de provocar algum efeito, mas não caindo no erro de confundir a educação com a pedagogia social, pois enquanto que a primeira se multiplica na sua diversidade de conceitos, esta última assenta na valorização de uma multiplicidade de espaços educativos de intervenção comunitária e na edificação de um mundo mais humano e solidário.

O reconhecimento da centralidade do ser humano nos processos de desenvolvimento das pessoas e das comunidades, trouxe a pedagogia para o coração das práticas da inclusão social, muitas vezes valorizada como mais uma estratégia, ou instrumento, ao serviço do maior envolvimento e integração dos cidadãos. Ora, na Educação Social, a pedagogia representa muito mais do que um meio precioso na obtenção de determinados fins, ela funciona como um saber matricial, como o universo antropológico, epistemológico e axiológico de referência de toda a sua prática profissional, enquanto promotores da educabilidade em tecidos excluídos.

A educação é um meio para chegar a um fim e só faz sentido se acreditarmos na educabilidade do ser humano, na evolução do “outro”, enquanto mentor do seu próprio crescimento pessoal e social. Por essa razão devemos olhá-la como uma arte, como uma política e/ou prática de relação, marcada pela intencionalidade, pelo desígnio da mudança, de formar para o desenvolvimento humano e para os valores como proximidade, hospitalidade, bondade, para os direitos humanos e para uma partilha de igual, para igual com o “outro” e para o “outro”. Podemos mesmo dizer que educar é questionar e em concordância com Paulo Freire, é (des)ocultar as verdades para sermos protagonistas do nosso próprio futuro.

Parafraseando, Delors (1996) “Um dos principais papéis reservados à Educação consiste, antes de mais, em dotar a humanidade da capacidade de dominar o seu próprio desenvolvimento”.

É neste sentido que surge a educação social, como desenvolvimento completo de cada pessoa e como “membro estratégico” de uma sociedade regida pela cooperação e solidariedade, mas também pela desigualdade e marginalização social, onde a educação se torna um imperativo inseparável do progresso social e humano.

Enquanto Educadores de âmbito Social, devemos reflectirmos sobre a necessidade de se continuar a aprofundar as origens e proveniências do fenómeno da exclusão, da exclusão social e da condição de pessoa sem-abrigo), mais do propriamente que entender as causas que originam a exclusão.

Um efeito particular da globalização consiste na emergência e agravamento de situações de risco social, ligadas a várias rupturas e desequilíbrios sociais. Com a mundialização da economia, deu-se um aumento da pobreza, das desigualdades sociais, da marginalização e da exclusão nas suas diversas formas. Podemos acrescentar que a exclusão pode-se mesmo localizar em função do desnível entre classes sociais e as carências socioeconómicas e culturais. Não queremos com isto dizer que a desigualdades sociais e os fenómenos ligados à pobreza só agora tenham surgido, mas sabemos que se têm vindo a agravar.

As opiniões e os conceitos sobre exclusão são diversificados e variam de acordo com as tendências políticas sociais e com as mutações que as sociedades, como a nossa, vão sofrendo.

A questão da exclusão e da marginalização deve ser sempre analisada de acordo com os seus diferentes níveis e correctamente inserida nos seus contextos sociais e históricos.

A exclusão social é um fenómeno que provoca desigualdades no que se refere ao acesso do mercado de trabalho, a uma pensão de reforma que permita a subsistência de quem a aufere, a um rendimento suficiente para cobrir todas as despesas essenciais, a uma habitação condigna e com o mínimo considerável de condições.

As “exclusões"sejam elas de que grau for, não deixam de ser problema social ou uma realidade que carece de acções e políticas de integração social. O termo de exclusão, no sentido que é divulgado pela sociologia, é recente, apesar de este subsistir com um sentido mais restrito em outras sociedades de outros tempos.

Como sabem a exclusão social é uma «fase extrema do processo de marginalização, sendo este um percurso descendente, no qual se vão verificando sucessivas rupturas na relação do indivíduo com a sociedade, como por exemplo, ruptura com o mercado de trabalho, a qual se traduz em desemprego, sobretudo de longa duração, ou mesmo num desligamento irreversível face a esse mercado. A fase extrema (exclusão social) é qualificada não só pela ruptura com o mercado de trabalho, mas também, maior parte das vezes e directamente ligada pelas rupturas familiares, afectivas e de amizade.

Para se intervir sobre um conjunto de problemas que têm na sua base múltiplas causas, temos de reunir um conjunto diverso de instrumentos intervenção, onde não podemos, nem devemos excluir noções como a cidadania, participação, solidariedade, compromisso social, redes e actores sociais, onde a Educação Social, pode ser um factor de coesão, se procurar ter em conta a diversidade dos indivíduos e dos grupos humanos, evitando tornar-se um factor de exclusão social.

A equação do «problema social» não pode, por isso, continuar a ser pensada apenas por referência à fractura que, alegadamente, separa uma maioria de incluídos de uma minoria de excluídos. São múltiplos os pontos de ruptura social, como são múltiplas as razões que os explicam.

A intervenção assente em politicas sociais e educativas permite a definição de diferentes níveis de intervenção social, laboral, familiar ou comunitária, aos diferentes públicos a que se dirige. Todas as intervenções que visem a criação de ambientes propícios ao desenvolvimento saudável das pessoas, podem enquadrar-se na chamada educação social, “para e com”, onde os educandos são também eles educadores. Ela pretende compor mentalidades, treinar as atitudes e os comportamentos, desenvolvendo competências de sociabilidade e de integração.

A exclusão não se relaciona com facto de ter ou não acesso aos sistemas e nem toda a forma de exclusão revela falta de acesso a sistemas sociais básicos, na medida em que, uma pessoa pode ser excluída de alguns sistemas sociais e não o ser em relação a outros.

Devemos sim, defender antes que é através da criação de diversas actividades e estratégias de intervenção sócio-educativa, que os Técnicos Superiores de Educação Social podem junto de pessoas e/ou grupos sociais afectados por situações de exclusão social ou outras privações sócio – económicas e culturais, educar para uma vida dialógica, fomentando a autonomia e cidadania das pessoas.

De certa forma, podemos dizer que à Educação Social no plano da inclusão social, cabe, acima de tudo, ajudar a cumprir essa responsabilidade social, ocupando assim um lugar de “encontro” entre a intervenção educativa, a intervenção social e cultural.

Ao contrário dos técnicos do serviço social, o educador social não intervém apenas numa base de «empowerment», para a Educação Social, a pedagogia funciona, mais do que uma simples estratégia de intervenção, ela corresponde ao próprio saber matricial dos educadores, chamados a desenvolver uma prática relacional subordinada ao princípio da educabilidade de todos os seres humanos. O educador social surge-nos assim como um actor e mediador social, um profissional da condição humana preparado para apoiar pessoas, ou grupos, com dificuldades (sociais, culturais, educativas) na concretização das suas ambições, desejos e realizações pessoais, através da pedagogia social.

Enquanto técnico de relação, desenvolve o seu papel profissional sempre a partir e com uma intenção pedagógica, de respeito pelo “Outro”, pela sua personalidade e vontade, tentando desenvolver com ele uma atitude reflexiva da sua condição humana e do seu próprio desenvolvimento.


Consideremos, como exemplo, o papel do Técnico Superior de Educação Social nas escolas, como promoção da inclusão: Problemas como o absentismo, o insucesso escolar, a violência, a mediação entre a família e a escola, são questões que requerem uma intervenção sócio – educativa especializada, baseada na escuta, no diálogo e no aconselhamento, que permite aos alunos e respectivas famílias, superar e aprender a gerir dificuldades, ansiedades, instabilidades, tomadas de decisão e/ou frustrações, sentidas no quotidiano escolar e fora dele, ajudando-os. Os Educadores Sociais funcionam aqui também como mediadores na promoção da relação entre escola, família e comunidade, podendo ainda desenvolver planos de formação, dirigidos a toda a comunidade educativa, no âmbito da prevenção primária de comportamentos de risco, da educação para a saúde, cidadania, educação sexual, cuidados básicos de higiene, entre outros.

A “reabilitação”, seja ela social, afectiva e profissional das pessoas deve ser uma aposta educativa, onde o gosto pela vida e pelo poder criativo de cada um se pode melhorar o quotidiano e criar pessoas mais responsáveis e participativos, diminuindo assim as desigualdades e processos de exclusão e esse é o papel da Educação Social.

Segundo Isabel Baptista (1998:51) «(…) cabe à Educação introduzir o individuo no universo dos costumes, ajudando-o a fazer a aprendizagem das regras que devem orientar a sua acção no mundo.»

De acordo com Adalberto Dias de Carvalho, «Se a educação se reporta tradicionalmente às situações correntes de ensino-aprendizagem e de transmissão de valores culturais e éticos, seja em contexto escolar, seja no âmbito da família ou de instituições religiosas, já a pedagogia social tende a aparecer ligada a espaços sociais de contornos educativamente indefinidos que, talvez por isso, escapam às malhas mais estreitas dos projectos educativos intencionalmente estruturados» (2003:6). Podemos acrescentar que a pedagogia social se encontra virada para uma mudança positiva, através de uma intervenção sócio-educativa.

Nas palavras de Manuel Ferreira Patrício (1992:5), «o saber humano não é uniforme, isto é, não tem apenas uma forma. Não é apenas lógico, é também mitológico, axiológico, técnico, tecnológico e institivo.

A educação é um meio para chegar a um fim e esse fim é a inclusão plena e só faz sentido se acreditarmos na educabilidade do ser humano, na evolução do “outro”, enquanto mentor do seu próprio crescimento pessoal e social.

Por essa razão devemos olhá-la como uma arte, como uma política e/ou prática de relação, marcada pela intenção, pelo propósito da mudança, de formar para o desenvolvimento humano, para os valores como proximidade, hospitalidade, bondade, para os direitos humanos e para uma partilha de igual, para igual com o “outro” e para o “outro”. Podemos mesmo dizer que educar é questionar as verdades para sermos protagonistas do nosso próprio futuro.

Não podemos esquecer que a educação e a formação são processos, que tem por detrás a noção do histórico e do social. Mais do que factores aleatórios, o que influencia a educação é a capacidade ou ausência dela, de poder influenciar atitudes e comportamentos para os mudar, em função de padrões e modelos válidos num determinado contexto ou rede.

PARA REFLECTIR

Numa Sociedade que se diz Pluralista e Democrática, mas que convive diariamente com a violação dos Direitos Humanos, com a exclusão de pessoas e grupos a quem lhes é suprimida a oportunidade de ser mais e melhor, é imprescindível a intervenção da Educação Social, como principio de uma inclusão absoluta de todos.

Deixo-vos uma certeza, enquanto Educadores e técnicos sociais temos de promover novas formas de encontro, apostando numa politica de diversidade e igualdade, respeito pelo próximo e pela sua identidade enquanto pessoa, onde a educação as é a ferramenta de minimização de factores de exclusão e também de desenvolvimento e promoção de processos de integração.

As opções de ser e estar, devem ser valorizadas e reconhecidas numa nova política social, facilitando muito a interacção e inserção de grupos minoritários em sociedades dominantes, diminuindo assim processos de ostracismo, isolamento ou mesmo de exclusão e auto – exclusão, potenciando espaços de desenvolvimento humano. Esses espaços só podem ser implementados por técnicos ligados ao saber matricial da pedagogia social, que actuam em diversos tecidos sociais.

É neste sentido que surge a educação social ligada à inclusão ela é “membro estratégico” de uma sociedade regida pela cooperação e solidariedade, mas também pela desigualdade e marginalização social, onde a educação e a pedagogia social se torna um imperativo inseparável do progresso social e humano.

Apesar da necessidade de se continuar a aprofundar a pertinência da educabilidade como princípio da inclusão e da integração, tenho uma certeza, a exclusão social existe e pode ter várias formas de o ser e de se desenvolver, mas pode também ser uma simples opção do outro que dever ser respeitada. Entendo que mais do que tentar perceber as causas que originam a situação de exclusão ou do percurso muitas das vezes que leva à condição de sem-abrigo, é prioritário apontar soluções e mecanismos que minimizem o problema de quem não quer estar e ser excluído.

«O princípio de igualdade de todos perante a lei é o princípio fundador da democracia, garantida pelo Estado de direito.», Clavel (2004:185).

Esse é o trabalho da Associação Cais, educar para uma vida dialógica, para a autonomia e cidadania, essa é a nossa preocupação de fundo, através da criação de diversas actividades e estratégias de intervenção social, junto da pessoas em desvantagem social, afectados por situações de exclusão social ou outras privações sócio-económicas e culturais. Existem 2 Centros CAIS, o primeiro foi em Lisboa e o segundo Centro CAIS no Porto, em Outubro de 2006. Caracterizam-se ambos por Centros de Dia, comunitários e polivalentes

Nas actividades desenvolvidas pelos Centros, cada participante pode (re)descobrir capacidades; criar relações de amizade e convívio; trabalhar a auto-estima; dar sentido e qualidade ao tempo livre; recuperar autonomia; recriar a formação académica e profissional, adquirindo competências sociais, tendo em vista a concretização de um percurso de vida, que faz uso da criatividade, da participação e da diversidade. No workshop que iremos apresentar em seguida, poderão conhecer melhor o trabalho no prático desenvolvido pela Associação e pelos seus Centros.

Termino com uma frase da Dra. Isabel Baptista que enquadra perfeitamente no fim desta partilha;

“No contexto das sociedades contemporâneas, a indiferença em relação ao destino do outro só pode ser vivida como um egoísmo sem inocência. A exclusão consciente do outro é uma ignorância que sabe o que ignora e, como tal, é inaceitável à luz dos valores de um humanismo universal.”

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